Conteúdo apresentado na desconferência do I Fórum de Mídia Livre, no Rio de Janeiro, em dezembro de 2008.
O anúncio publicitário que você viu hoje no jornal, na TV, na internet, no rádio ou em qualquer mídia, por aí, já foi pago. E muito bem pago! A publicidade, com todas as cifras envolvidas, é o primeiro imposto direto pago pelo cidadão, ou se quiser, pelo consumidor. O faturamento da mídia em 2007, no Brasil, ultrapassa os R$ 26 Bi. Segundo dados da revista Meio e Mensagem, só as Casas Bahia, representam nesse montante mais de R$ 1 Bi, correspondente aos seus comerciais diários. Da mesma forma, outro bilhão desse negócio é composto pela verba publicitária do governo federal e de suas empresas estatais. Com esses números, podemos perguntar: quem paga essa conta? Bem, a das Casas Bahia é você, leitor, quando compra aquele fogão ou geladeira novos; a do governo, esse pagador você conhece bem; também é você!
O entendimento de que a publicidade é o primeiro imposto direto é compartilhado por muitos pesquisadores e pensadores da comunicação, passando por Oliviero Toscani, antigo fotógrafo da Beneton italiana; Roberto Menna Barreto, escritor e; o professor e economista, Ladislau Dowbor. Segundo Dowbor, em seu ensaio Democracia Econômica, em 1998 o PNUD apontava que o mercado publicitário planetário girava em torno de US$ 430 Bi. Outros estudos, de 2001, já indicam um movimento superior a mais de US$ 1 Tri. O fato é que quando compramos um produto, qualquer que seja ele, não vem discriminado o que estamos pagando ali. Na composição de preço de um produto, também estão embutidos os custos referentes à pesquisa, marketing, royalties, designs, trabalhos jurídicos e, é claro, publicidade, que juntos, podem ultrapassar mais de 75 % do valor. Porém essa informação nos é negada.
Além de pagarmos bem caro pela publicidade que somos compulsoriamente obrigados a ver, somos também submetidos a bobagens e criações grotescas. O caso dos automóveis é emblemático: vemos nos comerciais super carros que deslizam suaves pelas areias das praias ensolaradas, ou caros que andam nas cidades em alta velocidade e com conforto total. Essa realidade é linda! Só não fosse o sal do mar que vai enferrujar o veículo, e as marginais ou 23 de Maio em SP, por exemplo. Para comprovar a falácia da realidade construída pela publicidade, segundo pesquisas sobre o trânsito em SP, há cem anos a velocidade média dos veículos na cidade era de 16 Km/h, com carroças, e alguns bondes. Hoje, com os carros super potentes, a velocidade é a mesma.
Qual é a responsabilidade dos veículos que publicam esses anúncios? O que a mídia tem haver com nossas vidas?
O que tudo indica é que o negócio das grandes corporações de comunicação está focado na venda do espaço publicitário – venda de mídia – e não no conteúdo que muitos veículos e editoras se dizem comprometidos com seus públicos. Então, é a venda pela venda. Não o conteúdo para seus leitores, ouvintes, internautas, transeuntes ou telespectadores.
O que nos atinge hoje é saber que fizemos muitas coisas erradas nos últimos dois, três séculos – na dita era moderna. Pelo que se sente no ar, nossas vidas estão à beira do abismo: dois terços da população ainda vivem abaixo da linha da pobreza, dezenas de guerras acontecendo, aquecimento global, destruição dos ecossistemas, entre mais algumas barbáries. Mas isso parece que não tem nenhuma relação conosco. Então está fora da mídia! Da mesma forma, o debate sobre a sustentabildade ou sobre a qualidade de nossas vidas e de nossos filhos, temas que parecem um centro importante para o debate sobre nossa existência, também estão distantes da comunicação de massa; e é claro, da publicidade.
Podemos ver em qualquer jornal nacional, regional ou municipal e, quem sabe, até de bairro, páginas duplas, áudios e vídeos, com anúncios dos últimos modelos dos carros mais lindos da concessionária tal. É claro, no próximo espaço de anúncio certamente estará a marca concorrente bastante visível. Porém, um repórter, sabe lá como essa pauta surgiu e conseguiu ser publicada entre outras notícias tão importantes, como, o modo que os Nardoni jogaram a criança ou que no SPFW contou com a presença da Gisele; esse nosso jornalista consegue publicar uma matéria que denuncia o congestionamento das principais vias de acesso daquela comunidade e aponta o excesso de veículos como uma das principais causas. E que o nível de poluição nunca havia chegado naqueles patamares. É claro que isso é apenas uma simulação, que não acontece de verdade!?
No caso acima, qual é a posição desse veículo de comunicação? Ajudar a vender mais carros naquela cidade e entulhar as vias, ou debater com a população as alternativas de vida ou de sobrevivência? Qual é o papel dos veículos de comunicação? Qual é o papel da mídia e dos espaços publicitários?
Voltando ao nosso tributo diário, um debate na sociedade deve acontecer: a democratização das verbas publicitárias. Quando pagamos qualquer tipo de imposto, queremos que aquele recurso seja administrado e utilizado corretamente e que atenda as necessidades reais e concretas a que se destina, para todos, como a melhoria das estradas, a qualidade na saúde, o saneamento básico nas nossas cidades, e assim por diante. Para a publicidade, os pressupostos devem ser os mesmos.
A publicidade deve receber maior atenção e controle social, para que a banalidade e abusos à nossa inteligência não sejam permitidos, de forma que o espaço publicitário tenha relação direta com as necessidades das pessoas, apresentando conteúdos mais sofisticados e de interesse público.
Da mesma forma, o dinheiro da publicidade – a verba publicitária – deve ser direcionado a todos os veículos que tenham penetração segmentada, mesmo que os seus índices de Custo Por Mil, metodologia a nosso ver ultrapassada, não apontem números satisfatórios, considerando sim a participação desse veículo como mais um canal de relacionamento e de comunicação social, devendo, dessa forma, fazer parte dos planos de mídia das empresas e dos governos. Medida como esta democratizaria os recursos publicitários e fortaleceria pequenos veículos de comunicação, sejam de distribuição nacional ou regional, que hoje ficam à margem dos investimentos em mídia, além de garantir o direito universal da comunicação, para todos.
É dentro dessa perspectiva que as proposições lançadas pelo Fórum de Mídia Livre são fundamentais para estabelecer um novo diálogo na sociedade, percebendo a publicidade como um patrimônio público e social.
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